Friday, May 16, 2014

Um épico encontro fluvial

Alguns andaram notando minha ausência.

Há dias atrás revelei que preciosos pertences meus estavam no tal fatídico voo Kuala Lumpur - Beijing que desapareceu. Foi para os ares, diria eu! Lá estavam caixas e caixas de fotos, fitas, filmes, recortes de jornal e revistas que comprovam muitas das coisas que alego neste blog. Foi tudo para os ares. Quer dizer, assim penso eu. Insistem em dizer que o avião foi para o mar, e não para os ares. Sendo assim, fui convidado para uma mais uma busca no Oceano Índico. Como minha fama de mergulhador em águas profundas é internacional, e tenho interesse pessoal no assunto, aceitei, embora ache que a possibilidade do avião estar no fundo do mar seja 1%. O avião não achei, porém, acho que vi uma lula gigante a alguns metros de distância e quase saí atrás dela.

Isto me fez lembrar um caso. O ano era 1983. Fui convidado a visitar algumas minas de ouro no Pará, e fui para Santarém. Lá, como de hábito, fiquei no melhor hotel da cidade, que era o Tropical. Uma ideia um tanto curiosa essa de colocar um hotel razoável como aquele em Santarém, no inicio dos anos 80! Francamente. O incentivo fiscal deve ter sido excepcional, pois apesar da sua beleza natural, em Alter do Chão, a cidade não tinha absolutamente nada a oferecer aos turistas naquela época.

Portanto, não me supreendeu que o hotel de quase 200 quartos estivesse praticamente vazio. Além de mim e meus dois assistentes, havia um casal de alemães e um pequeno grupo que jantava no lado oposto do salão. De longe escutei francês, e logo reconheci um grande amigo, era o Jacquot!

Fui falar com ele e a festa foi grande. Eu e Jacques Cousteau nos conhecíamos de longa data, inclusive comemos muito juntos no Le Lapin Troubadour de Paris. Sempre amei oceanografia, e fiquei frustrado por que foi a única faculdade que não terminei. Quando estava no último ano fui convidado para presidir um banco suìço, uma oportunidade irrecusável. Não estava nem aí para o salário, afinal de contas dinheiro nunca me faltou, porém, sempre quis presidir um banco, foi um sonho realizado. Sendo assim, quando Jacquot e eu nos encontrávamos a conversa sempre era bastante técnica.

Eles estavam filmando um documentário na Amazônia, e agora estavam no ecosistema das águas azuis do Rio Tapajós. Porém estavam tendo um problema sério. Aparentemente, um imenso e bravo pirarucu invocou com o barco do Cousteau, e de fato, já tinha atacado o barco diversas vezes, não deixando os mergulhadores de Costeau fazer seu trabalho. Já sabia o que Jacquot iria pedir...

Cabe aqui um porém. Hoje em dia acho graça nessas lutas de vale tudo. Não desmerecendo, fui um dos primeiros campeões de jiu-jitsu no Brasil, mas, me especializei numa perigosíssima modalidade da qual poucos saíram vivos - lutar com animais selvagens de grande porte. Já lutei com jacarés, monstros de gila, tubarões, rinocerontes, ursos, além dos meus animais caseiros (leão e onça), e me sagrei campeão mundial. Saí do esporte com vida. Jacquot queria que eu amanssasse o pirarucu.

Nunca tinha ouvido falar de pirarucus mal humorados, portanto, a empreitada aguçou minha curiosidade oceanográfica. Quer dizer, nesse caso fluvial. Aceitei o desafio.

No dia seguinte, fomos para as pacatas águas do Tapajós, até que apareceu o peixe. Realmente estava bravo. Veio numa alta velocidade e deu uma cabeçada no casco do barco. Daí ficou dando voltas ao lado da embarcação. Resolvi deixá-lo se cansar um pouco, para facilitar a briga. O bicho parecia que não se cansava. Não tive opção senão me jogar na água, e começar a chutar a sua traseira. Agarrei seu corpo, e dei muitos socos, mordidas, e ele só foi ficando mais nervoso. A certa altura abriu a grande boca, e não acreditei no que vi. O coitado estava com um dente infeccionado, por isso estava nervoso! Voltei ao barco e expliquei a situação ao Jacquot.

Nessa hora é bom ser dentista formado, embora não praticante. Preparamos um sossega-leão forte para o peixe, e armamos uma pequena plataforma dentro da água. Usei alguns instrumentos cirúrgicos muito básicos, e arranquei o dente em pauta e coloquei um antiobiótico. Deixei o peixe dormir em paz, para passar o efeito da anestesia. Quando acordou, o peixe de 200 quilos parecia aliviado. Juro que olhou para mim agradecendo, deu meia volta e foi se embora.

Só o Jacquot para me aprontar uma dessas.

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